24.10.08

A CURA II

O olhar perdido no profundo das privações. Assim ele era. Assim ele se via. Recolhido em si, o sorriso vago era disfarce; suas mãos inquietas, reflexo da falta pela qual se via tragado. Continha-se, embora seu interior gritasse. Contemplava-a à distância com uma ternura contida, quase servil. E naquele dia, ele a teve, embora sem saber. Sem que ele notasse, do alto de suas torres tão bem alicerçadas, ela se entregou. E foram um do outro sem perceber, no mesmo instante em que julgavam ver outro sonho, na realidade, esmaecer.



***
Do tempo:
Registre-se, publique-se e cumpra-se.
***

15.5.08

A CURA

De joelhos, o rosto marcado das horas passadas. Horas sonhadas, desejos retalhados pelo fim. Ao fundo, um bolero compassava o choro - antes sufocado - e embalava as lembranças de um tempo bom. Enfrentava, embora não sem medo, o caminho que se mostrava longe e indefinido, e agora, precisaria ser percorrido. Temia o que poderia ser um desvio definitivo, a despedida da única certeza que a alimentara durante anos...
E assim, como que num ritual, despiu-se do passado. Deixou-se curar.




***
Do tempo:
Registre-se, publique-se e cumpra-se.
***